Em Belo Horizonte, ex-faxineira vira "celebridade" por falar quatro línguas
Ex-faxineira do Mercado Central Maria da
Conceição da Silva fala inglês, holandês, italiano e espanhol, além de
"arranhar" alemão, árabe e hebraico
Não restou outra alternativa nesta sexta-feira (17) à administração do
Mercado Central de Belo Horizonte: arrumar um uniforme novo para as
imagens e organizar as entrevistas da ex-faxineira Maria da Conceição da
Silva, após a súbita fama da pernambucana, quando os colegas
descobriram que ela fala inglês, holandês, italiano e espanhol, além de
"arranhar" alemão, árabe e hebraico, e contaram para a diretoria do
mercado.
Com isso, em pouco mais de 15 minutos de conversa, com o
superintendente do mercado Luiz Carlos Braga, informado no início de
maio, que, além de poliglota, a faxineira tem formação superior em
contabilidade, Maria da Conceição foi promovida a atendente turística do
Mercado Central. Seu salário passou de R$ 674 (salário mínimo) para R$
1.100, com a promoção.
"Estamos organizando. É para ficar mais ajeitado", afirma o
superintendente, que pede que os jornalistas formem uma fila para falar
com a empregada do mercado.
Maria da Conceição atendeu a reportagem do
UOL, entre
os desfiles que fez nos corredores do mercado para as imagens e as
entrevistas individuais que concedeu aos repórteres. A agora atendente
turística disse que há exageros na repercussão do caso e que não se
sente celebridade.
"Senhor, estão exagerando. Eu só falo quatro línguas. O alemão, árabe e
hebraico, eu só arranho o alemão, árabe e hebraico. Não tem nada disso
não", diz Maria da Conceição.
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Para aprender inglês, taxista pratica idioma com passageiros 8 fotos
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O
taxista Osvaldo dos Santos aproveita as horas vagas para estudar
inglês. "Treino diariamente", afirma. Para aprender a língua que tanto o
encantou, ele desenvolveu um método autodidata. Há 16 anos dirigindo
pelas ruas de São Paulo, ele tentava aprender algumas frases com a ajuda
de passageiros. "As pessoas entravam aqui no meu táxi e eu perguntava
como era tal frase em inglês, daí eu anotava como se fala para decorar.
Além de treinar, eu ainda forçava o passageiro a tirar o inglês dele da
gaveta", contou
Leia mais Leandro Moraes/UOL
"O hebraico estava aprendendo com um amigo marroquino. Eu só arranho, não falo".
O mundo sem fronteiras
"Sou filha de pais separados. Meus irmãos mais velhos foram criados
pela minha avó materna. Um outro foi criado por parentes. Minha mãe me
doou ainda bebê. Mas arrependeu-se e me buscou mais tarde.
Aos 11 anos, Maria da Conceição trabalhava como recepcionista e, a mãe,
como doméstica. "Estudava em colégio de freiras. No escritório, fazia
serviços gerais e datilografia". Mudou-se com a mãe para Fortaleza e lá
fez o ensino fundamental num colégio militar.
Após o período na capital cearense, transferiu-se novamente com a mãe
para Elesbão Veloso (PI), onde morou na casa de uma irmã. De lá, foi
para Teresina e concluiu o ensino médio no Colégio Salesiano. Mudou-se
com a mãe para Campina Grande (PB), onde trabalhou em diversas
profissões.
"Comecei no levantamento de estoque em uma loja de autopeças, depois
fui para o balcão. Aprendi muito. Fiz serviços hidráulicos e de servente
de pedreiro também. Fui doméstica e até em oficina mecânica trabalhei".
Nessa cidade paraibana, em 1991, a mãe morreu.
Em 2005, Maria da Conceição trabalhava numa oficina de informática
quando conheceu um alemão, um espanhol e uma holandesa. Eles faziam
intercâmbio no país e foram embora. Mas a amizade foi mantida por meio
de contatos pela internet. "Numa dessas conversas, entrou uma mineira,
dez anos mais nova, que se tornou minha companheira. Sou homossexual".
As duas foram convidadas pela amiga holandesa para se mudarem para lá.
Toparam e, em Amsterdam, fizeram faxina e reforma de residências para
sobreviver. Foi aí, que Maria da Conceição começou a aprender, "com uma
certa facilidade", as línguas que hoje domina.
Voltou o ano passado, após ter conhecido boa parte da Europa, e veio
morar com uma irmã em Belo Horizonte e, óbvio, teve de procurar emprego.
Acabou arrumando o de faxineira do mercado e, agora, a promoção, quando foram descobertas suas qualificações.
15 minutos de fama
Dá um sorriso largo e avisa à reportagem, quando se prepara para
atender outro jornalista, já impaciente na fila: "Eu sei disso tudo. São
os 15 minutos de fama..."
"Você acha que eu sou boba? Isso tudo passa rápido". Entretanto, não
esconde uma leve expectativa com a súbita fama: "Emprego? É. Isso pode
ser que melhore um pouco", afirma Maria da Conceição, antes de partir
para outra entrevista.
Em Belo Horizonte, desde setembro do ano passado, procurou trabalhar em
escritórios mas não conseguiu. "As pessoas criavam dificuldades: veio
da Europa? O que fazia lá? Já passou dos 40? Tem curso superior,
precisamos de pessoas com formação até o ensino médio", diz.
"Fiquei sabendo que havia vaga na faxina do mercado e fui ao
escritório. Mas não apresentei currículo e omiti a formação superior e o
fato de falar outras línguas", afirma.
Ela afirma teve dificuldades para arrumar emprego em Belo Horizonte,
mesmo com a boa formação educacional. Por isso, foi para a faxina do
mercado e, agora, o atendimento aos turistas.