Conta uma antiga tradição indiana que o
Senhor Shiva sempre que decide vir à Terra toma a forma humana de um
yogue errante. Shiva é a divindade que, mais do que qualquer outro deus
indiano, serviu de modelo aos yogues. Segundo essa mesma tradição, Shiva
realmente existiu, há milhares de anos, na forma humana de um sábio
yogue. No entanto, as histórias a ele relacionadas apresentam um caráter
um tanto quanto mitológico. Sua imagem encontra-se constantemente
associada ao monte Kailash, no Himalaia – morada das neves –, sua
principal residência e alvo de inspiração dos yogues, sadhus (ascetas
virtuosos) e samnyasins (renunciantes da vida mundana).
Shiva, o pai do Yoga, é uma das personalidades mais citadas nos Puranas
(1). Acredita-se que Shiva tenha vivido um período de sua vida nu, com
apenas uma fina camada de cinza recobrindo seu corpo – como vivem, ainda
hoje, muitos yogues reclusos na Índia – ou como se vestiam os antigos
ascetas hindus que moravam nas distantes florestas e nas cavernas do
Himalaia.
Muitas vezes, Shiva é representado
trajando apenas uma pele de tigre ao redor da cintura e/ou uma espécie
de manta – também do mesmo material – em torno do tronco, com um de seus
ombros descoberto e com algumas serpentes najas ao redor do pescoço, da
cintura e dos braços, e uma lua crescente em seu longo e indisciplinado
cabelo. A respeito dessa representação, há uma antiga e interessante
história que conta como ele adquiriu tal aparência.
Certa vez, o rei dos demônios,
incomodado com a sabedoria e os poderes de Shiva, enviou um dos seus
súditos na forma de uma peçonhenta serpente naja para matá-lo. Antes que
a serpente o mordesse, Shiva – o “Senhor de todas as Criaturas” –,
agilmente, pegou-a com a mão, domou-a e a colocou como adorno ao redor
de seu pescoço. Então, a serpente tornou-se sua fiel amiga e
companheira. Furioso, o rei dos demônios enviou outro demônio mais feroz
na forma de um terrível tigre. Ao lutar com o feroz animal, Shiva
percebeu que ele não poderia ser adestrado e que precisaria matá-lo. Com
a sua pele, confeccionou uma roupa para se vestir.
Essa história mostra-nos que os momentos difíceis e de atribulações podem muito ajudar a crescer como pessoa, a compreender muitas situações e, consequentemente, tornar melhor e mais capaz; que não se deve desesperar e desanimar e, sim, procurar extrair das circunstâncias desfavoráveis algo de útil, um aprendizado ou proveito, assim como o fez Shiva. A partir desse posicionamento, é possível tornar-se mais autoconfiante, experiente, forte e sábio.
Essa história mostra-nos que os momentos difíceis e de atribulações podem muito ajudar a crescer como pessoa, a compreender muitas situações e, consequentemente, tornar melhor e mais capaz; que não se deve desesperar e desanimar e, sim, procurar extrair das circunstâncias desfavoráveis algo de útil, um aprendizado ou proveito, assim como o fez Shiva. A partir desse posicionamento, é possível tornar-se mais autoconfiante, experiente, forte e sábio.
Shiva como Mahadeva é o grande deus do
panteão hindu; como Shankara (o pacificador), um yogue meditante; e como
Shambo ou Shambhu, o mestre benevolente. Shiva, muitas vezes, é também
representado portando em sua mão um tridente – trishula – arma sagrada
com a qual ele destrói o mal e a ignorância. A naja é a mais mortal das
serpentes. Uma naja como adorno ao redor do pescoço e da cintura
simboliza que Shiva dominou a morte, tornou-se imortal. Ela também
representa a kundalini desperta, o constante estado de samadhi – de
superconsciência – em que ele se encontra. O tambor (damaru) que ele
segura na mão, quando assume a forma de Nataraja – o deus dançante –,
simboliza o som do nascimento do universo (o mantra OM). É com ele que
Shiva marca o ritmo do universo, as eras (yugas) e o compasso de sua
dança. O touro branco (nandi) é a sua montaria e seu mais fiel
companheiro. Esse animal quase sempre se encontra próximo de Shiva.
Montar um touro branco simboliza dominar a violência, controlar a
própria força e a energia sexual.
Shiva e a lua
A Lua (chandra) continuadamente muda de
fase, o que representa os ciclos da natureza e a renovação a qual todos
os seres estão sujeitos, o ciclo do nascimento e da morte. Também
representa as emoções humanas e suas alternâncias. Uma lua crescente na
cabeça simboliza que Shiva também dominou as emoções e alcançou a
equanimidade. A Lua reflete a luz recebida do Sol. No cabelo de Shiva,
ela reflete a luz do Absoluto. O rio Ganga (Ganges) que jorra do alto da
cabeça de Shiva simboliza a purificação, meio pelo qual ele confere aos
devotos a dádiva da libertação (moskha).
Outro poderoso símbolo relacionado a
Shiva é o linga (o falo). Alguns de seus seguidores (shaivas),
especialmente os lingayatas, usam o shiva-linga como amuleto. No
interior dos templos hindus dedicados a Shiva existem línguas de vários
tamanhos, confeccionados de rocha, mármore ou metal, que são
reverenciados com guirlandas de flores, incensos, frutas e leite pelos
brâmanes (casta sacerdotal) e devotos. Para os yogues e hindus, a
representação ereta do pênis não significa algo obsceno e/ou imoral, e
sim o aspecto masculino do criador, a representação do princípio da
fertilidade, do poder e da força de Shvia
Uma das representações mais importantes de Shiva é: (1) Natharaja –
o “Rei (raja) dos Mestres (natha)”, também reverenciado como o
“Senhor dos Dançarinos”, com quatro braços, ele dança envolto pelo
elemento fogo, símbolo da transformação e renovação, e sobrepuja com
um de seus pés o demônio anão da ignorância - imagem ao lado. Através
de sua dança – tandava –, Shiva cria, conserva e dissolve o universo. |
A natureza e todas suas manifestações
são resultantes de sua eterna dança. (2) Pashupati – o “Senhor dos
Animais e de todas as Criaturas”. E (3) Ardhanarishvara – Shiva é
representado, ao mesmo tempo, com o seu aspecto masculino (lado direito:
Shiva, consciência ou Purusha) e feminino (lado esquerdo: Parvati,
matéria ou Prákriti). Aí simboliza o princípio masculino e feminino do
universo.
Shiva parece não se adequar a um padrão
comportamental definido, foi um grande revolucionário. Às vezes,
compenetrado, contemplativo, sério, severo, guerreiro, invencível.
Outras vezes, sereno, benevolente, brincalhão, bom esposo e frágil.
Shiva, algumas vezes, parece não dar importância à etiqueta social e às
regras morais de sua época.
No entanto, autêntico, verdadeiro, sábio e benevolente, Shiva é o epítome do verdadeiro yogii, da liberdade, da sabedoria, do poder, da espiritualidade e de uma consciência completamente desperta, desapegada e iluminada. Tornou-se o grande Mestre e Senhor dos Yogues – Yogiishvara – e um dos deuses mais fascinantes, adorado e reverenciado de toda a Índia.
No entanto, autêntico, verdadeiro, sábio e benevolente, Shiva é o epítome do verdadeiro yogii, da liberdade, da sabedoria, do poder, da espiritualidade e de uma consciência completamente desperta, desapegada e iluminada. Tornou-se o grande Mestre e Senhor dos Yogues – Yogiishvara – e um dos deuses mais fascinantes, adorado e reverenciado de toda a Índia.
Gilberto Coutinho