Novas evidências reforçam que o QI não mede de verdade a sua inteligência
A cada dez anos, o QI médio cresce cerca de três pontos.
O psicólogo James Flynn passou décadas documentando este estranho fato,
que foi denominado Efeito Flynn. A pergunta é: o Efeito Flynn
significa que estamos ficando mais espertos? Não para o próprio Flynn,
que diz que o efeito apenas revela que o QI mede habilidades
ensináveis, e não as natas. Como a educação mudou com o tempo, as
crianças melhoraram em testes padronizados como o QI. E então as
pontuações subiram.
Mas alguns pensadores se agarram à ideia de que o QI mede uma inteligência nata que transcende cultura
e educação escolar. Se for verdade, então espera-se que os elementos
mais abstratos e “livres de cultura” não estejam sujeitos ao Efeito
Flynn. Mas eles estão. E agora dois pesquisadores de psicologia
mostraram os motivos.
O que mudou nossas mentes?
O site Io9 entrevistou um pesquisador de psicologia da Universidade
Estadual da Flórida, Ainsley Mitchum, que acabou de publicar um estudo
no Journal of Experimental Psychology com seu colega
Mark Fox. Eles observaram mudanças em como as pessoas pontuavam nas
partes dos testes de QI que abordavam as matrizes de Raven, que mediam a
habilidade das pessoas de pensar abstratamente. Esses testes sempre
envolvem gráficos e reconhecimento de padrões, e são considerados
livres de qualquer diferença cultural.
Ainsley e Mark tiveram sorte o suficiente para encontrar um relatório
detalhando as pontuações de um grupo de jovens que fizeram o teste das
matrizes progressivas de Raven nos anos 60, e compararam com as
pontuações de jovens que estão fazendo o teste agora. Os resultados
eram consistentes com o Efeito Flynn. “Pessoas que tinham a pontuação média há 50 anos estariam abaixo da média agora”, disse Ainsley. Mas como pode ser?
Em culturas modernas, mais ênfase tem sido dada em abstração. Alunos
aprendem álgebra mais precocemente do que costumavam, por exemplo, mas,
além disso, nossas vidas cotidianas estão cheias de abstrações.
Ainsley constatou que só o ato de usar pastas em seu computador já
requer certo nível de pensamento abstrato que as pessoas não
encontrariam facilmente na vida cotidiana há 50 anos. “Esse padrão deixa você mais confortável ao romper as características superficiais dos objetos”,
explicou Ainsley. Então uma cultura mais avançada tecnologicamente,
combinada com diferenças em educação, aprimora a habilidade das pessoas
para pensar abstratamente.
Abstração é cultural
Com o tempo, nossa habilidade de lidar com informação abstrata está
mudando. O que isso significa é que a própria abstração é cultural e
muda com o tempo assim como muitos outros aspectos de nossa cultura. É
provável que as gerações passadas fossem mais literais em seu modo de
pensar. Eles lidavam mais frequentemente com objetos no mundo real, e
não precisavam entender coisas como avatares – ícones que representam
um objeto real – ou como traduzir um pequeno movimento no pulso em um
movimento em uma tela.
Ainsley afirmou:
“Os
psicólogos querem dizer a você que a inteligência mede uma habilidade
essencial que é natural às pessoas – uma quantidade real, não algo que é
cultural. Então eles construíram esses testes que foram designados
para não serem sensíveis a culturas (como as matrizes progressivas de
Raven). Mas a inteligência não pode ser olhada como algo separado da
cultura. Nós discutimos que as mudanças em pontuações em testes não se
traduzem em mudanças na habilidade. Isso não significa que nós estamos
evoluindo para pessoas mais inteligentes. O dado sugere que o que está
mudando é a sabedoria. Há um tipo de sabedoria abstrata que as pessoas
agora têm em números maiores. As pessoas em média não tinham isso há 50
anos”.
Ainsley constatou que você pode ver essa transformação muito além das
fronteiras da tecnologia. Até o meta-humor (ou seja, humor que faz
piadas de si mesmo), como o humor referencial em Community (seriado
norte-americano exibido no Brasil pela Sony), é muito mais abstrato do
que aquilo que as pessoas gostavam em Os Três Patetas há meio século.
Se houver uma mudança substancial na tecnologia no futuro, Ainsley
acredita que nós veremos mais uma mudança no modo como as pessoas
aprendem e lidam com a informação: “Não deveria ser surpreendente
para as pessoas que quando nosso ambiente muda rapidamente, a maneira
como as pessoas lidam com informações muda com ele”, disse Ainsley. “Nós mapeamos o nosso ambiente. Então o que estamos vendo em testes de QI é a pegada disso”.
Provavelmente, você não é muito mais esperto ou menos esperto que a maioria das pessoas
Se o seu QI é majoritariamente o resultado do seu ambiente, o que isso
diz sobre inteligência? Alguns de nós não nascem com mais dons mentais
que outros? Provavelmente não, diz Ainsley. “Adultos neurotípicos provavelmente não diferem tanto quando parecem”,
disse. Certamente algumas pessoas têm deficiências cognitivas
resultantes de ferimentos na cabeça, síndromes neuroquímicas e
deficiências de desenvolvimento. Mas pessoas cujos cérebros estão na
faixa da normalidade não diferem muito em termos de habilidade mentais
natas. O que nós medimos como “inteligência” em testes de QI é
principalmente ambiente e experiência.
Isso não quer dizer que testes de QI não têm utilidade. Na verdade,
eles são uma grande ajuda para traçar o modo como às culturas estão
mudando com o tempo. Esses testes estão nos ajudando a traçar a maneira
como modos de pensar são passados de geração em geração, mudando no
caminho.
Você gostaria de fazer o teste de matrizes progressivas de Raven? O exercício está disponível gratuitamente on-line, clicando aqui.
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